Produto pode ser aproveitado na
alimentação humana. Mel retirado das colmeias da região não era viável
comercialmente porque fermentava com calor e umidade.
Por
Globo Rural
A criação de abelhas é normalmente volta para a produção de mel. Mas uma
colmeia também gera outros produtos de valor comercial, como o pólen, que pode
ser aproveitado na alimentação humana. Em Canavieiras, no litoral Sul da Bahia,
uma cooperativa de criadores resolveu apostar nisso.
A descoberta da produção de pólen na região foi mais um acaso do que uma
escolha. As primeiras coletas de mel realizadas ainda na década de 1980
revelaram um produto impróprio para o comércio, porque ele acabava fermentando
com a alta umidade e o calor. Daí, em vez de abandonar a criação, os produtores
mudaram o foco para o pólen.
Para isso, foi preciso adaptar o manejo, porque produzir pólen é mais
complicado do que trabalhar com mel.
“A coleta do pólen é diária. A do mel, você faz o manejo a cada 15, 20 dias
e colhe dali a 3, 4 meses”, diz a professora Lídia Barreto, da Universidade de
Taubaté (Unitau), em São Paulo, uma das maiores referências brasileiras em
apicultura.
Lídia explica que a composição também é diferente. Enquanto o pólen é
proteína, o mel é carboidrato. “Proteína se degrada muito rapidamente. Então, o
trabalho com o pólen tem que ser muito rápido.”
Segundo ela, Canavieiras é “um paraíso para pólen”, porque a flora no
local é abundante.
Polén de flor e de abelha
O pólen é um dos produtos que as abelhas usam na sua dieta. Lídia
Barreto explica que o pólen das abelhas é bem diferente do pólen das flores.
“O pólen botânico tem uma composição química única e estritamente do
vegetal. A partir do momento que a abelha começa a fazer coleta, ela adiciona
um pouquinho de saliva, ou de néctar ou um pouquinho de mel. Ele passa a ser um
pólen com produtos da colmeia e passa a se chamar pólen apícola”.
O pólen é retirado de diversas flores e, por isso, tem cores e sabores
variados. Na alimentação humana, pode fazer parte de diversas receitas.
“Cabe em várias preparações, do doce ao salgado, e até no jejum”, diz
Fabíola Nejar, nutricionista da Unitau.
O jeito mais comum de se consumir é in natura. O produto tem uma
crocância e um pouco de acidez. Pode entrar na mistura da receita, ou no
acabamento. “O ideal é finalizar como pólen, para evitar a perda de nutrientes,
segundo Fabíola.
'Rodízio' de livro
O início da produção em Canavieiras teve uma dose de curiosidade.
“Naquele tempo não tinha internet, não tinha nada. Tinha um livro para as
pesquisas para a gente conseguir saber como se criava abelha. E esse livro foi
passava na mão de um e outro”, conta o apicultor Aneilan Nascimento.
Ele conta que, no começo, só sabia que a abelha produzia mel. “Depois
que a gente foi descobrir que tem outras fontes de renda. Tem a produção de
pólen, tem a produção de geleia real, de própolis…”
Em meio a essa sede de conhecimento, o pólen foi se firmando como um
produto ímpar. A começar pela localização de alguns apiários. Para se chegar a
Barra Velha, onde está José Roberto da Silva, um dos apicultores mais atuantes
na produção de pólen, é preciso atravessar um rio.
A produção na ilha é dividida em 3 apiários, com cerca de 120 colmeias.
José Roberto conta que escolheu uma ilha para fazer a produção por falta de
área disponível no continente. “As áreas próximas da cidade já estavam todas
saturadas por apicultores. O potencial da ilha era bom, uma área descansada,
uma diversidade muito grande de palmeiras”.
Coleta
Toda coleta do pólen é feita com a ajuda de um plástico todo furadinho,
colocado na entrada da caixa. Os furos têm o tamanho exato do corpo das abelhas
(4,6 milímetros) que, quando passam por eles com as patas carregadas, acabam
tendo que deixar o pólen para trás.
Na Bahia, uma adaptação feita nessa placa possibilitou um aumento de
produtividade de 100 até 180 gramas por colmeia, diariamente. Eles inclinaram
em 45 graus a placa que era usada reta, aumentando assim o campo de pouso das
abelhas.
Segundo José Roberto, depois de passar pela tampa, as abelhas só ficam
com 35% do pólen. Os outros 65% ficam para ele vender. Por isso, a cada 15 dias
é preciso abrir a caixa para repor a proteína retirada dos insetos.
“Pode ser à base de pó de pólen, açúcar e mel. Ou à base de soja, milho
e trigo”, explica.
Processamento
Se, no campo, os apicultores incorporaram técnicas que melhoraram o
manejo com as abelhas, na cidade, um entreposto construído dentro das normas do
Serviço de Inspeção Federal, o SIF, projetou o pólen de Canavieiras no cenário
nacional. E impulsionou as vendas para todo o Brasil.
A produção chega diariamente no entreposto, diretamente da produção. Do
jeito que chega do campo, o pólen é entregue para ser peneirado. Logo em
seguida, passa por um congelamento a -18°C e só de lá quando a umidade despenca
para menos de 4%.
Depois, ainda tem a ventilação, para a retirada das impurezas leves, e o
trabalho quase cirúrgico da catação manual. Finalmente, limpo e seco, é só
embalar.
Para a coordenadora do programa de apicultura da Secretaria de
Desenvolvimento Rural da Bahia, Marivanda Eloy, a conquista do SIF mudou não só
a qualidade do pólen, mas, principalmente, a qualidade de vida dos produtores.
“O apicultor já sabe quanto vai ter no bolso, porque sabe que nesse
mercado não vai ter nenhum problema em relação à comercialização.”
Análises de qualidade
No centro de estudos da Unitau, em Taubaté, São Paulo, são feitos os
testes exigidos para a comercialização. Ao todo, sete ensaios compõem a
instrução normativa do Ministério da Agricultura. Eles são capazes de
identificar problemas no processamento e a composição do produto, como gordura,
açúcar e proteína.
“Um formão que cai no chão, uma fumaça que vai excessivamente para o
pólen, tudo é detectado nas nossas análises”, diz Lídia. “Isso tem dado uma
qualidade para o trabalho dos apicultores, está retornando financeiramente,
empoderando famílias”, completa.
O produtor Anselmo Matos Nascimento tem 60 caixas de abelha. Para ele, a
compra do pólen pela cooperativa fortalece o trabalho.
“É mais fácil, a união faz a diferença”, afirma. “Sozinho você tem a
dificuldade de juntar um volume de produção para poder atender uma determinada
empresa. Mas quando junta a produção do grupo, você tem um poder de oferta.”
Concentrado em produzir, ele consegue de 3 a 3,5 quilos de pólen por mês
em cada colmeia e diz que consegue ter uma renda de cerca de R$ 1,5 mil,
livres.
Os criadores vendem pólen por R$ 65 o quilo. A atividade não impede o
produtor de explorar outras fontes de renda no sítio.
Postar um comentário
Blog do Paixão